sexta-feira, 4 de agosto de 2023

Materiais acerca do Ciclo de Revoltas 2018-2021 [PARTE 2]

Apresentação

Continuamos nesse texto a publicação dos textos traduzidos acerca do ciclo de revoltas de 2018-2021, que havíamos iniciado aqui. Reforçamos a necessidade de difusão e compreensão desses e de outros episódios que ocorreram desde então, como forma de nos armarmos na teoria e na prática.

Sumário

  • “De Teerã a Beirute, uma revolução que não se extinguirá” (lema proferido nas manifestações no Líbano) - Relato franco-iraniano (Dezembro de 2019);
  • “De Bagdá a Beirute, nem sunita nem xiita. Vamos continuar a luta!” (Janeiro de 2020) - Proletarios Internacionalistas; 
  • A situação do Líbano pré-explosão de Beirute e uma declaração de solidariedade (5 de agosto de 2020) - Retirado de uma publicação do Facebook (com pequenos ajustes);
  • Análise da atual crise e revolta em Cuba desde a perspectiva comunista radical  (18 de Julho de 2021) - Proletarios Revolucionarios;
  • A Colômbia arde! - TŘÍDNÍ VÁLKA.


“De Teerã a Beirute, uma revolução que não se extinguirá” (lema proferido nas manifestações no Líbano)
Relato franco-iraniano (Dezembro de 2019)

Texto originalmente publicado em francês em 9 de dezembro de 2019. Disponível aqui-

Traduzido ao espanhol e publicado em 22 de dezembro de 2019 por “Pensamiento inútil”. Disponível aqui.

Essa tradução ao português é realizada a partir do espanhol.

 


Nas últimas semanas, uma revolta popular em grande escala estourou no Irã. Sua falta de estruturação política parece ter sido sua força e sua fraqueza. Sua força, já que nenhuma organização foi capaz de enquadrar e domar a revolta e não foi possível ao governo enfraquecer o movimento prendendo as lideranças como fez durante a Revolução Verde de 2009. Mas também sua fraqueza, já que o movimento parecia mal coordenado diante de uma repressão tão rápida quanto feroz, sem ter sido documentado até aquele momento e sem uma reação coordenada no Irã ou na diáspora iraniana, devido ao corte da Internet. Um amigo franco-iraniano nos propôs este texto sobre esses eventos. 

No Irã, quase dez anos depois do Movimento Verde contra o ex-presidente Ahmadinejad, toda uma população está se levantando novamente contra o governo do regime que está no poder há 40 anos.

Na sexta-feira, 15 de novembro de 2019, um dia após o aumento arbitrário e considerável dos preços dos combustíveis, centenas de milhares de pessoas participaram de manifestações em uma centena de cidades, de norte a sul. Principalmente das classes trabalhadoras, queimando as bombas de gasolina, assim como centenas de bancos e centros ideológicos do regime islâmico (escolas religiosas e centros dedicados aos aiatolás onde os iranianos são convidados a vir rezar pelos representantes do regime), bloqueando as principais rodovias, o movimento rapidamente tomou conta do país.

Esta nova medida imposta ao povo iraniano, que deveria beneficiar as famílias mais desfavorecidas, surge em um momento de crise econômica que só se agravou desde o embargo e o restabelecimento das sanções internacionais por Donald Trump. A suposta redistribuição de benefícios fiscais sobre combustíveis, prometida pelo regime, afetaria, na verdade, apenas uma pequena minoria de iranianos. Em particular, excluiria os solteiros mais pobres, que são numerosos no Irã, onde o desemprego afeta quase 30% da população jovem.

Mas, para além do impacto considerável e imediato desta reforma na qualidade de vida dos iranianos, é sobretudo a crescente intensificação das normas promulgadas pelo regime islâmico, no poder desde a revolução de 1979, o que está na origem da revolta. Corrupção, despossessão e expropriação de casas são comuns no Irã (na verdade, é comum que pessoas próximas ao regime usem suas conexões para obter a expulsão do inquilino de uma casa que lhes interessa) e apenas agravam o profundo abismo entre as diferentes classes sociais, num país onde o recurso à justiça só beneficia os mais influentes e onde a própria lei proíbe críticas ao Governo e ao Guia Supremo.

A cruel repressão à insurreição, com o apoio do Ayatollah Khamenei, foi realizada tanto fisicamente pelo exército dos Guardiões da Revolução (Pasdaran) e pelos milicianos Bassidji, bem como com um bloqueio virtual da rede Internet por 36 horas após o início da revolta, impossibilitando qualquer forma de comunicação (interna e externa) e, por extensão, qualquer denúncia da violência da repressão. 

Dado que o Governo, desde as primeiras horas, autorizou - e encorajou - o uso da força com armas de fogo, franco-atiradores, helicópteros, canhões de água, bem como golpes e gás lacrimogéneo, o último relatório da Amnistia Internacional indica que morreram pelo menos 208 manifestantes para cada cinco membros das forças de segurança e 7.000 foram presos. Em contraste, a mídia controlada pelo estado relata apenas uma dúzia de mortes no total. 

A maioria das vítimas vem das províncias árabes e curdas, as populações mais pobres do Irã, que há muito são discriminadas mas, não surpreendentemente, estão na linha de frente do levante. Esta repressão aos curdos iranianos é pouco divulgada internacionalmente, enquanto o PKK, muito influente na diáspora curda, centra o seu discurso na denúncia do Estado turco e no imperativo da defesa de Rojava (que fica no Curdistão sírio). Devido a várias negociações entre o PKK e o regime sírio sobre o futuro de Rojava, o PKK não denuncia as ações do aliado iraniano de Bashar Al-Assad, o PJAK, braço iraniano do PKK, encerrou todas as atividades oficiais desde 2012. As outras organizações curdas não se beneficiam de redes diplomáticas equivalentes, a repressão aos curdos no Irã está muito mal documentada.

O protesto popular do povo iraniano, embora sufocado pelo regime, encontrou apoio entre os países vizinhos afetados pela interferência iraniana, notadamente Líbano e Iraque, onde faixas e lemas dos manifestantes estimularam a revolta. A partir daí, o tom do porta-voz da polícia, Ahmad Nourian, endureceu quando disse que o exército “não hesitaria em enfrentar aqueles que perturbam a paz e a segurança”. 

Por outro lado, a nível internacional, houve pouca cobertura mediática do levante ou uma condenação formal dos atos de repressão. A Casa Branca, acreditando que o regime iraniano havia “abandonado seu povo”, naturalmente encorajou a rebelião iraniana contra a pobreza causada em parte pelas sanções estadunidenses. O interesse econômico de Trump em estabelecer um governo próximo aos Estados Unidos torna sua compaixão hipócrita, na melhor das hipóteses, assim como o faz o Ministério das Relações Exteriores da França, que simplesmente “(reitera) seu apego ao respeito à liberdade de expressão e ao direito ao protesto pacífico”.

O levantamento muito gradual do bloqueio às redes desde 23 de novembro foi acompanhado por manifestações de partidários do regime que foram fortemente instados pelas autoridades iranianas a “denunciar o saque de propriedade pública e privada” e “ingerência estrangeira”, em total contradição com a crescente publicação de vídeos e testemunhos civis sobre a violência das autoridades, bem como a revelação de nomes e retratos de vítimas de todas as origens: estudantes, transeuntes, manifestantes, trabalhadores, etc.

Até o momento, a insurgência parece ter sido suprimida em geral pela repressão armada, condenada a grandes dificuldades pela falta de coordenação entre os diversos grupos sociais, sem organização política ou sindical, uma vez que é proibida pelo regime. A principal fragilidade do movimento tem sido causada pelo fechamento da Internet desde o início do movimento, que poderia ter proporcionado um elo entre os diferentes grupos da nação, tanto internos quanto externos ao país, Mas este novo vento de protesto, apoiado pelas populações libanesa e iraquiana, que também estão se rebelando, dá uma nova esperança de mudança para uma população que tem sofrido na indiferença por muito tempo.

“O exército da tirania se estende de um extremo ao outro do mundo, portanto, desde toda a eternidade e para toda a eternidade, é o tempo dos pobres. (...) Tenham cuidado, porque a realeza e o poder dependem inteiramente do serviço prestado na soleira dos pobres”. Hâfez, século XIV.


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 “De Bagdá a Beirute, nem sunita nem xiita. Vamos continuar a luta!” (Janeiro de 2020)

Proletarios Internacionalistas


O governo iraquiano é composto por todas as facções burguesas do Iraque e é aclamado tanto pelas forças regionais quanto pela burguesia mundial, mas o proletariado tentou derrubá-lo.

A “Zona Verde” é o centro do capitalismo mundial em Bagdá. O proletariado tentou tomá-la, perdendo inúmeras vidas nessa tentativa.

O porto de Basra é um corredor global para as exportações e o comércio internacional de petróleo. O proletariado o bloqueou e tentou assumir o controle do mesmo.

A polícia, as forças de segurança e as forças especiais e militares no Iraque são forças do capitalismo mundial envolvendo xiitas, sunitas, cristãos, curdos e turcomanos, com um amplo complemento de forças regionais e internacionais, incluindo tropas dos Estados Unidos, Europa, Turquia, Irã, etc. O proletariado os atacou, tanto em seus centros como nos destacamentos de rua. Muitos proletários foram mortos (mais de 650) e mais de 20.000 feridos (sem falar no número de sequestrados e presos).

Em todas as áreas rebeldes do Iraque, o proletariado queimou sedes de partidos políticos (religiosos e nacionais, sem exceção), invadiu e queimou as casas de membros do parlamento, de funcionários do Estado e também realizou ataques a edifícios de segurança, da polícia, da mídia, as instituições judiciais, ao Ministério da Justiça, a jornais e estações de televisão.

Ao fazer tudo isso, o proletariado atacou a totalidade do Estado.

Segundo o primeiro-ministro Adel Abd Al-Mahdi, esse movimento destruiu a economia nacional (capitalista) em todos os seus aspectos.

Nesta luta, o proletariado ataca tudo sem exceção: todo símbolo, pessoa ou lugar vinculado à história da autoridade e da repressão, incluindo os militares, as instituições diplomáticas, os centros comerciais e os serviços secretos, tanto internos como externos. Os ataques às forças repressivas de Pasdaran e ao consulado iraniano na cidade de Karbala, não são ataques anti-iranianos como dizem os meios de comunicação, mas fazem parte da ação coletiva contra as forças e centros repressivos em todas as suas formas, tal como o ataque à “Zona Verde” e outros locais.

Não está de todo clara a unidade de ação proletária e seus slogans – “Abaixo todos os ladrões”, “De Bagdá a Beirute, nem sunitas nem xiitas!”, “Nem pátria, nem trabalho, estamos todos nas ruas, nem pátria, nem trabalho, até que este sistema seja derrubado!” – e que o proletariado aponta a contrarrevolução em sua totalidade, assim como aconteceu em Basra durante setembro de 2018?

A burguesia sempre tentou distorcer e desviar a trajetória de classe de nosso movimento revolucionário. Eles recorreram a vários métodos para esvaziar o conteúdo revolucionário de nossa luta, tecendo todos os tipos de tramas em torno dela para transformá-la em qualquer outra coisa. Tudo para esconder sua repressão sangrenta e a destruição do movimento revolucionário mediante conflitos burgueses.

O proletariado se insurgiu socialmente contra os exploradores e pretende acabar com seu poder. Ele está ciente de que os capitalistas externos e internos (xiitas, sunitas, curdos, cristãos, judeus…, os ricos e exploradores de todo o mundo) são os verdadeiros membros do Estado e todos eles estão unidos para explorar a humanidade. Consequentemente, a luta proletária é sem dúvida uma luta unida contra todos eles.

O proletariado militante não permite que ninguém o represente, não tem demandas e nada para negociar. Não faz parte de nenhum programa político. Não é esta rebelião uma profunda luta de classes contra o sistema capitalista em sua totalidade? O único programa que o proletariado tem, sua única exigência, é continuar e liderar sua luta unida contra a ditadura do capital e do Estado. “Somos contra todos eles e vamos tomar tudo!”. Essa é a autonomia de classe e a força de luta do nosso movimento. Portanto, não é tarefa fácil para o Estado erradicar esse movimento.

O proletariado não está em situação de espera ou passivo. Desde que o movimento estourou, mesmo com a repressão massiva e assassinatos por parte do Estado, esse movimento continua e suas lutas e táticas se espalham dia após dia. Por exemplo, em Bagdá, o movimento formou unidades de combate espalhadas pela cidade para interromper o tráfego e assumir o controle de pontes ou áreas importantes. Ele coordenou coletivamente suas atividades para ampliar o escopo e a amplitude de sua luta, planejar o dia seguinte, a próxima meta, fazer publicações sobre sua luta, cuidar de seus companheiros feridos… Tudo isso é coordenar, organizar e expandir sua capacidade de luta.

Da mesma forma que no passado as lutas proletárias recebiam energias umas de outras e, assim, continuava o processo de luta, assumindo seus interesses de classe, sua internacionalização e rompendo os limites geográficos, ideológicos, econômicos, bem como os democráticos e do Estado nacional… esse movimento se voltava contra o capital e o capitalismo mundial e hoje está acontecendo o mesmo.

O proletariado hoje, do Haiti à França, da França a Hong Kong, do Egito a América Latina, do Líbano ao Iraque e Irã, está na mesma luta, lutando contra o mesmo inimigo, com os mesmos interesses e com a mesma esperança: derrubar o capitalismo e afirmar uma comunidade de vida humana sem exploração, lucro, capital, trabalho assalariado, poluição, injustiça, guerra e destruição.

Esta luta proletária não é uma luta “anarquista”, tampouco é uma luta “socialista”, nem por uma questão de democratizar o poder ou o estado nacional, mas sim uma luta revolucionária, de classe e internacional contra o domínio capitalista sobre a vida (e sobre a terra). É uma luta para libertar a vida de todas as formas de escravidão humana.

Se hoje os jovens militantes saíram às ruas participando e tomaram a iniciativa da luta, é algo completamente natural! Porque esta geração, enquanto fugia da catástrofe diária do capital, sonhava com a vida. São quem não têm estabilidade de vida. O que eles têm hoje podem não ter amanhã. O que eles sentem perto hoje pode estar longe amanhã. A ganância do capitalismo, suas guerras e desastres sucessivos os deixaram em uma luta constante. Esta situação se intensifica cada vez mais em todo o mundo e se torna um inferno que empurra o proletariado para a luta e sua luta é a luta da vida contra este inferno capitalista. Os proletários em luta compreendem o capitalismo e sua catástrofe, sentem-se vivos e felizes na luta pela vida.

A luta proletária é a luta da classe explorada contra o mundo capitalista. É uma luta pela vida contra as relações de exploração e morte do capital mundial.

O proletariado continua lutando: da França ao Líbano, do Iraque ao Chile, de Hong Kong ao Irã… e clama pela revolta de todas as áreas vizinhas onde a unidade e a coordenação das ações de classe sejam possíveis nesta luta contra o capitalismo.

Em nossa região, a luta do proletariado na Turquia, Israel e Irã… bloqueia as possibilidades da guerra capitalista e empurra nossa guerra de classes internacional para uma perspectiva melhor.

Abaixo a exploração e a opressão!

Abaixo a guerra! Abaixo o capitalismo!

Pela continuidade da guerra de classes em todo o mundo!


Companheiros da luta internacional

Proletarios Internacionalistas

Oriente Médio
Novembro de 2019
Comunicação Companheira Internacional: internationalist@riseup.net

info@proletariosinternacionalistas.org

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A situação do Líbano pré-explosão de Beirute e uma declaração de solidariedade (5 de agosto de 2020)

Retirado de uma publicação do Facebook (com pequenos ajustes)

No final de setembro de 2019, pequenos protestos se iniciaram na cidade de Beirute (capital) no Líbano. As manifestações se espalhariam por todo o país em outubro.

A eclosão dos protestos pode ser associada a um conjunto de fatores, das quais podemos destacar os seguintes:

O Líbano passa por uma séria escassez de divisas. Diante dessa situação, o governo adotou uma política econômica que dificultava o máximo o uso de dólares. No entanto, a economia libanesa é extremamente dependente de importações (petróleo, alimentos, produtos medicinais, etc.) e, consequentemente, precisa de divisas para as suas transações regulares. Isso fez com que, em 26 de setembro, os proprietários de postos de gasolina declarassem greve em função da dificuldade de pagamento dos fornecedores.

Em outubro, os libaneses também presenciaram os piores incêndios florestais em décadas. A ineficiência das autoridades em combater as chamas também revoltara as massas (uma vez que o governo teve problemas lidar com as queimadas devido à falta de manutenção dos helicópteros contra incêndios).

No famoso ranking de 180 países da Transparência Internacional, o Líbano está na 137ª posição. A população reclama da corrupção endêmica no governo.

Além disso, a dívida pública do país já era 150% superior ao PIB. As manifestações pautam o não-pagamento da dívida.

Diante dessa situação toda, o país é tomado por protestos. Em 17 de outubro, como medida para lidar com o orçamento estatal, o governo apresenta como estratégia uma série de impostos, dentre os quais se destaca o imposto sobre chamadas de Whatsapp. Em 18 de outubro o país é paralisado por manifestações que bloqueiam as ruas que ligam a Beirute. O primeiro-ministro, Saad Hariri, é obrigado a renunciar (29 de outubro).

Em 2 de dezembro, os EUA libera 100 milhões de dólares em ajuda militar ao Líbano (valor que estava congelado há um tempo, provavelmente porque Trump estava especulando a melhor barganha política). Diga-se de passagem que sempre é bom para os EUA ser credor de um país endividado.

Já em 2020, com uma dívida pública em 170% do PIB, o governo decide, em março, dar o primeiro calote da história do país. Neste caso, as autoridades propuseram não pagar um vencimento da dívida em eurobônus de cerca de US$ 1,2 bilhão.

Enquanto isso, o Banco Mundial projeta que a crise do país deve empurrar metade dos libaneses para a pobreza extrema. 1/4 da população já está desempregada no Líbano e a escassez de recursos, em virtude do baixíssimo nível das importações, levou a 75% da população a se alimentar através de ajuda humanitária. Tudo isso em meio à pandemia de coronavírus (que também afetou o setor de turismo da economia libanesa, responsável por 20% do PIB do país).

Enfim, com todas essas condições, ter uma explosão catastrófica no coração do país vai contribuir para multiplicar a miséria [1].

Até onde eu pesquisei, o saldo da explosão foi: 78 mortos (até então registrados), 4000 feridos e a possibilidade de contaminação da atmosfera com as toxinas do nitrato de amônio que teria ocasionado o evento, portanto: um risco desastroso para a saúde dos atingidos.

A solidariedade que anunciamos ao povo libanês é a seguinte: irmãos e irmãs da classe proletária libanesa que tanto sofrem as adversidades deste maldito sistema, utilizem o quanto antes as forças que ainda lhes restam para liquidar com a classe dominante de vosso país, expropriando tudo de que necessitam para enfrentar essa terrível situação que foi criada por essa mesma classe que vos parasita e ainda lhes força a pagar a dívida que eles mesmos criaram! Destruam o Estado que sustenta esses cretinos! Amplie vossa insurreição até seus camaradas que sofrem no fogo cruzado da guerra civil na Síria, armem-se para controlar essa situação, intervir nessa geopolítica imperialista é elevar a luta de classes imediatamente ao campo internacional da qual é imanente. A América Latina também foi contemporânea em matéria de revolta social com vocês, nossas lutas estão interligadas, vamos fazer nossa parte desde aqui para seguirmos firmes até a derradeira vitória da revolução social mundial contra esse sistema que sacrifica nossas vidas (e o próprio planeta) em prol da valorização do valor (do Capital, dos lucros).

Proletários e proletárias do mundo, uni-vos!
 

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Notas:

[1] – Refere-se às explosões no porto de Beirute em agosto de 2020.


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Análise da atual crise e revolta em Cuba desde a perspectiva comunista radical  (18 de Julho de 2021)

Proletarios Revolucionarios

 

Esse texto foi traduzido do espanhol, disponível aqui.

 

Os fatos e suas falsas versões de direita e de esquerda

Através de ações de massa diretas e espontâneas que vão desde fazer marchas e assembleias autoconvocadas até virar com as próprias mãos os carros de polícia e saquear tendas, o proletariado da região cubana levantou-se nas ruas contra a fome e contra a tirania estatal, ou seja, contra as miseráveis condições materiais de existência impostas pelo capitalismo e sua crise atual, da mesma forma que o fez o proletariado das regiões colombiana, birmanesa, iraniana e sul-africana durante este ano, e da mesma forma que o fez o proletariado das regiões equatoriana, chilena, haitiana, francesa e iraquiana, entre outras, há dois anos.

Com todas as suas fraquezas, limitações e contradições internas, a revolta proletária desses dias na região cubana é um elo ou um episódio a mais da tendência à recomposição da revolta proletária internacional que se abriu em 2018-2019 e que se viu “interrompida” pela pandemia e a ditadura sanitária contrainsurrecionária ou a contrarrevolução preventiva de 2020-2021 por parte de todos os Estados deste planeta.

Para começar, então, um ABC anticapitalista a respeito: desde que existem já há vários séculos, o capitalismo, a crise, o proletariado e a luta de classes são mundiais. As diferenças desses em/entre cada época histórica e cada região geográfica são somente de grau e de forma, não de natureza ou de substância, nas suas condições relações e categorias fundamentais. As quais, principalmente o trabalho assalariado e a acumulação de capital, espalharam-se e aprofundaram-se com o passar do tempo em todos os lugares. De tal modo que tanto o “socialismo cubano” como a “restauração capitalista em Cuba depois da queda da URSS” sempre foram mitos: na verdade, o que sempre existiu em Cuba é capitalismo e luta de classes, porém sob outra forma e em outro grau, da mesma forma que na ex-URSS e em todo o mundo. A única coisa que realmente mudou desde a caída do bloco soviético até agora é o predomínio do capital privado em comparação ao capital estatal sobre o proletariado, hoje em dia mais frágil e explorado.

Portanto, os dois pontos que seguem nesta parte de nossa análise são as duas versões da falsa dicotomia entre a direita imperialista do Capital e a esquerda anti-imperialista do Capital, ou seja, entre os dois tentáculos políticos do mesmo polvo monstruoso e gigantesco que é o sistema capitalista histórico-mundial: 

De um lado, a direita cubana e o imperialismo estadunidense estão capitalizando política e midiaticamente esta conjuntura emergente, sobre a base material da atual crise econômica, ecológico-sanitária e política, assim como a falta de uma situação histórica revolucionária e, portanto, de uma direção revolucionária autônoma das próprias massas em revolta.

Por isso, sua versão desses protestos massivos é a versão dominante ou da fração dominante da classe capitalista nos meios de comunicação, a fim de posicionar publicamente que “o socialismo não funciona” e que Cuba deve sofrer uma intervenção militar, política, tecnológica e “humanitária” para “reestabelecer a democracia, a liberdade e a paz social”, tal como no Haiti ou na Síria.

Por outro lado, o governo “socialista” cubano e a esquerda do Capital internacional concentram-se propositadamente apenas em seu oponente imperialista de direita, com o propósito de ocultar o capitalismo e a luta de classes realmente existente dentro de Cuba, para assim conservar seu poder e sua imagem de falsa revolução e falso socialismo/comunismo no clássico estilo stalinista-orwelliano, porém em sua versão latino-americana.

Por isso, o governo de Díaz-Canel e a esquerda pró-Cuba desqualificam e caluniam esses protestos massivos como “comandados e dirigidos pelo imperialismo”, “friamente calculados”, “manipulados”, “vendidos”, “com agenda intervencionista”, “com projeto golpista e colonialista”, “vermes”, “comedores de merda”, “mercenários”, “reacionários”, “fascistas”, “contrarrevolucionários”, etc. O que, de fato, é falso, absurdo, conspiratório e cínico.

E por esse motivo, o Estado cubano enfrenta essa revolta de massas combinando a repressão policial e militar (apesar do “apagão informativo” ou cerco comunicativo existente, até o encerramento desta edição sabe-se que já há 5 mortos, dezenas de feridos e mais de 150 detidos e desaparecidos) com a mobilização das bases sociais ideologizadas e encantadas que ainda lhe restam, assim como também recrutando à força jovens para que se somem às mesmas. Fazendo contramarchas igualmente repressivas (policiais de vermelho) onde gritam os habituais slogans patriotas de sempre e portam bandeiras nacionais e faixas com fotos de Fidel Castro que lembram o culto de personalidade na Rússia stalinista, assim como as declarações públicas de “anti-imperialismo, soberania nacional e socialismo”.

Porém, os fatos são ignorantes e, por mais que os governantes e seus lacais esforcem-se, a fome e a raiva massivas não podem ser escondidas.


As causas conjunturais e seus dados

De um lado, é a atual crise econômica e sanitária; mais especificamente, a gritante caída do PIB em 11% - a pior nas últimas 3 décadas –, da balança comercial – déficit de 9000 milhões de dólares, considerando que 80% dos produtos para consumo são importados –, das divisas pelo turismo – a segunda fonte de rendimento da economia e a população cubana, depois da exportação de profissionais, ou “capital humano” – e da produção e exportação de açúcar – por falta de combustível e avaria das máquinas –, devido à pandemia, e também devido à reforma monetária e cambial que foi decretada no fim do ano passado pelo governo de Díaz-Canel – chamada “Tarea Ordenamiento” – que, no lugar de neutralizar a crise, piorou-a (a cura acabou sendo pior que a doença).

O resultado disso tudo é que atualmente há desemprego, desabastecimento e inflação: há escassez de trabalho, de dinheiro, de alimentos, de medicamentos e de serviços básicos para a maioria da população em Cuba (dizemos para a maioria da população, porque a burguesia burocrática-militar cubana e os turistas estrangeiros gozam de todo tipo de privilégios). Como sempre foi nesse regime, porém hoje mais que antes, com o agravante do ressurgimento do Covid-19 (exemplo do fracasso do supervalorizado e mistificado sistema médico cubano, por certo) e seu impacto altamente negativo na saúde, na economia e na vida cotidiana.

De forma mais específica ainda: em outubro de 2020, 8 a cada 10 cubanos sobreviviam com apenas o suficiente, 67% das famílias qualificava a alimentação diária como deficitária, enquanto que para 6 de cada 10 famílias a caderneta de abastecimento cobria somente de 5 a 10 dias por mês. Depois da “Tarea Ordenamiento” em dezembro de 2020, tal situação piorou: aumentou o desemprego no setor público ao mesmo tempo em que a proletarização e a taxa de exploração (“mão de obra barata”) no setor privado, os serviços e bens da cesta básica subiram entre 500% e 600% (a luz, a água e os medicamentos tornaram-se praticamente impagáveis), e tanto as remessas de familiares no exterior como os depósitos bancários locais foram “retidos” ou “congelados” parcial e temporariamente pelo Estado. A tudo isso, soma-se o aumento de casos de contágio (mais de 275.000 pessoas) e morte (mais de 1.800 pessoas) por conta do ressurgimento do Covid-19 na ilha. Assim como também é muito possível que tenham aumentado os casos de depressão e suicídio.

Em outras palavras, esse é um mal-estar que vem sendo acumulado diariamente há décadas, agudiza-se no ano passado e explode este ano, pelas razões mencionadas anteriormente. A maioria da população desse país hoje está mais faminta, doente e desesperada que nunca antes.

Por esse motivo hoje, ao grito de “comida, eletricidade e vacinas”, os despossuídos e famintos de Cuba saem às ruas para protestar massivamente, como não faziam há décadas. Poderia ser dito, então, que se trata de uma “revolta da fome” no que decorre desse ano, tal como as que estouraram em todo o mundo durante 2008, ano da crise alimentícia. Tudo isso no contexto da crise de valorização que caracteriza a atual crise do capitalismo, como telão de fundo.

Por outro lado, é a crise política; mais especificamente, a “falta de instituições democráticas” ou de “poder popular” que canalizem e amorteçam as demandas sociais. Isso não é um “erro na construção do socialismo”, ou uma “contradição da revolução”, porque em Cuba não existe tal revolução, senão que, inclusive do ponto de vista politólogo e democrata da “governabilidade” e da “hegemonia”, o regime cubano já não é legitimo nem sustentável, senão que é a ponta da repressão e da mentira institucionalizadas (por exemplo, através dos “Comités de Defensa de la Revolución-CDR”).

Agora, de uma perspectiva anticapitalista e antiestatal, a outra causa conjuntural – com elementos de causa estrutural – dessa revolta é o poder totalitário que a burguesia estatal exerce sobre a maioria da população nesse campo de concentração caribenho, ou gulag tropical, que é Cuba; dito de maneira melhor, a ditadura capitalista e burocrático-militar do Partido “Comunista” Cubano (PCC) da rica e poderosa família Castro e do Grupo de Administración Empresarial S.A. (GAESA) de outros líderes militares – donos e acionistas da maioria das empresas, lucros e inclusive de “Panama Papers” desse país – sobre o proletariado – cada vez mais fragilizado, explorado, alienado e oprimido –, como em seu tempo foi também a URSS de Lenin e Stalin, assim como a China de Mao (essa ultima até o presente, junto com a Coreia do Norte e a Venezuela).

As evidentes diferenças entre Cuba e Rússia ou China é que entorno da metade do século passado a primeira converteu-se na nova e pequena colônia açucareira, com uma liderança militar “carismática” na governança, daquelas grandes potenciais capitalistas-imperialistas asiáticas que se disfarçavam de “comunistas”, e que, diferentemente das segundas que hoje seguem sendo potenciais já hiper-modernizadas, a primeira ficou petrificada ou enferrujada nesse passado, do qual fez, contudo, seu capital turístico para a classe média alta europeia e norte-americana, assim como um fetiche de apego emocional nostálgico para a esquerda latino-americana, também de classe média, do Capital, que defende religiosa e visceralmente o mito do “socialismo cubano”.
Pelo contrário, o proletariado anônimo da região cubana está farto de viver nessa penúria. Está farto de tanta miséria e opressão estatal. É por isso que nos últimos dias as pessoas têm saído em massa às ruas gritando “abaixo a ditadura” e “liberdade”.

Assim sendo, já não é somente uma “revolta da fome”, mas também uma revolta política, na qual lamentavelmente, em ausência de uma situação histórica e internacional revolucionária, o instinto de classe e a espontaneidade não bastam. O proletariado cubano também foi subdesenvolvido e reprimido em termos de luta revolucionária por parte do Estado cubano. Razão pela qual essa revolta está sendo capitalizada política e midiaticamente pela fração direitista e imperialista do Capital mundial, enquanto é reprimida física e simbolicamente pela fração esquerdista e anti-imperialista do mesmo Capital mundial.

Em outras palavras, o proletariado em revolta “na Ilha” encontra-se literalmente ilhado, desarmado e atacado por todos os lados. E, como demonstra a história da luta de classes, o isolamento condena toda revolta – e toda revolução – à derrota.

As causas estruturais e seus dados

NÃO é o “bloqueio imperialista” – como repetem os fanáticos do regime castro-stalinista –: os EUA é o nono provedor de artigos importados da ilha. Desde o ano de 2019, há 32 grandes empresas ianques (como Visa, Accor, Mastercard ou Amazon) que investem nesse país. Além disso, Cuba realiza comércio 170 países e atualmente 40% de suas exportações são “auxiliadas” pela China.

Tampouco é um inexistente “Estado operário degenerado”, nem uma “restauração capitalista” em Cuba que ocorre desde a década de 90 – como argumentam os trotskistas –, porque não é possível restaurar o Capital – entendido como relação impessoal e fetichista de produção e reprodução social, e não como simples propriedade jurídica ou formal sobre os meios de produção – onde nunca foi removido, e porque o único que realmente mudou desde então é o predomínio do capital privado, em comparação com o capital estatal, sobre o proletariado cada vez mais fragilizado e explorado.

Então o que é? É a crise econômica, política e social do subdesenvolvido Capitalismo de Estado cubano que, por sua vez, é dependente do mercado mundial. É o mito do “socialismo cubano” que cai por terra sob seu próprio peso, ou por suas contradições capitalistas e lutas de classes internas, não desde a queda da URSS, senão que desde que começou em 1959 e mais ainda hoje, na segunda década do século XXI, por causa da crise geral e multidimensional do capitalismo mundial, manifestada concretamente na crise econômica e sanitária atual, e acompanhada de protestos e revoltas proletárias cada vez mais frequentes e explosivas, porém, ao mesmo tempo, efêmeras e sem direção revolucionária autônoma e contundente das próprias massas, por falta de uma situação histórica revolucionária.

Esse contexto histórico-estrutural e global de catástrofe capitalista generalizada e luta de classes não-revolucionária, marcado por um desenvolvimento desigual, o caos, a turbulência e a incerteza, é o que realmente explica a crise, os protestos e as revoltas em todas as nações do planeta durante os últimos anos, das quais a revolta atual em Cuba é somente mais um episódio, apesar de suas particularidades já mencionadas.

Conclusões e perspectivas substanciais

Dado o atual contexto mundial de catástrofe econômica e ecológico-sanitária, contrarrevolução preventiva e revoltas efêmeras sem direção revolucionária autônoma de massas, que hoje em dia se manifesta de maneira mais intensa em países como Cuba, o mais provável é: que essa revolta proletária contra a fome e a tirania estatal continue sendo capitalizada politica e midiaticamente pela direita pequeno-burguesa cubana, o imperialismo estadunidense e seus coristas internacionais; que o Estado capitalista cubano, disfarçado de “socialista”, siga caluniando-a e reprimindo-a até derrota-la, sob o pretexto de que é “contrarrevolucionária”, também com a benção de seus coristas internacionais de esquerda; e que as massas exploradas e oprimidas da região cubana sigam acumulando fome, doença, desespero, raiva, experiência de luta e lições da mesma até um novo ciclo de estouros sociais do proletariado internacional contra o capitalismo mundial (o que, segundo o próprio FMI, é provável que ocorra em 2022).

Porém, para nós que fazemos o esforço de ver a realidade sem antolhos ideológicos ou mistificadores, essa revolta proletária espontânea consegue o mérito de destruir, nos fatos e em pleno século XXI, o mito do “socialismo cubano” e sua base ideológica que é o marxismo-leninismo, porque na verdade não são outra coisa que capitalismo e socialdemocracia “radical”, respectivamente. Em suma: não são a revolução, são a contrarrevolução. O regime político-militar-empresarial do Partido “Comunista” Cubano e sua empresa GAESA não defendem nenhuma revolução. Defendem a contrarrevolução capitalista e sua ditadura sobre o proletariado dessa região. É fração esquerdista, estatista e anti-imperialista do Capital mundial no Caribe. Aqueles que defendem esse regime são, portanto, igualmente contrarrevolucionários disfarçados de “revolucionários”.

Para que fique mais claro ainda e não aconteçam deturpações grosseiras e maliciosas por parte tanto de direitistas como de esquerdistas do Capital: a causa da atual crise e revolta em Cuba NÃO é que “o socialismo não funciona”, e NÃO é tampouco “o bloqueio imperialista” dos EUA. Diante de tantas notícias e análises falsas por todos os lados, o que é próprio da falsa dicotomia esquerda/direita, vale relembrar o ABC anticapitalista autônomo a respeito: o que existe em Cuba NÃO é socialismo ou comunismo, é capitalismo pura e simplesmente: mais especificamente, é um subdesenvolvido Capitalismo de Estado que participa de maneira subordinada e dependente no mercado mundial, e que hoje está em crise porque o capitalismo histórico e internacional está em crise.

Por quê? Porque não pode existir “socialismo em um só país”, já que o capitalismo é mundial. Porque a estatização ou a nacionalização da agricultura, da indústria, do comércio e do banco não é o mesmo que a abolição real – não somente formal ou jurídica – da propriedade privada sobre os meios de produção, distribuição e consumo. E, acima de tudo, porque no comunismo não existe produção de mercadorias, trabalho assalariado, extração de mais-valia, lei do valor, mercado, competição, empresas, acumulação de capital, dinheiro, classes sociais, Estado, patriarcado, máfias, prostituição, corrupção e nem fronteiras nacionais. De modo contrário, em Cuba existe tudo isso, não como categorias abstratas, mas como realidades muito concretas e cotidianas. Sim, em Cuba existem classes sociais: exploradores e explorados, opressores e oprimidos, marginalizadores e marginalizados. Por isso que em Cuba existe a luta de classes, uma prova irrefutável disso são os protestos das massas proletárias de todos os setores, sexos, “raças” e gerações contra o Estado capitalista, disfarçado de “socialista”, nesse país durante os últimos dias.

Por fim, em qualquer uma de suas versões, formas ou aparências, o sistema que realmente já não funciona é o capitalismo. Contudo, esse ainda sobrevive em meio a sua decomposição, devido à falta de condições e situações revolucionárias que somente as mesmas contradições estruturais do capitalismo e as lutas de classes reais em processo podem produzir – que são fenômenos materiais e espontâneos de massa, e que além do mais levam várias gerações –, e não a consciência, a ideologia, a propaganda, a vontade e o ativismo político de algumas poucas organizações e pessoas de esquerda e extrema-esquerda.

A perspectiva comunista radical contida nesta análise de conjuntura é produto não de algumas poucas mentes brilhantes e delirantes, senão da mesma luta de classes histórico-mundial e de nossa situação concreta de vida e luta. Assim sendo, nós comunistas antiestatais e internacionalistas estamos do lado dos explorados e oprimidos que lutam por suas vidas sem representantes nem intermediários e sem importar sua nacionalidade, porque nós proletários não temos pátria. De fato, um dos slogans mais contrarrevolucionários que pode haver é o de “pátria ou morte”, como o que repete automaticamente o atual governo esquerdista cubano e seus seguidores acríticos lá e em todas as partes. Diferentemente, nós estamos contra toda forma de capitalismo e de Estado-nação, incluindo o “Estado socialista” que na verdade é Capitalismo de Estado, determinado, por sua vez, pelo mercado mundial. Portanto, estamos contra a direita e a esquerda do Capital, já que ambas não são contrarias senão competidoras complementares e alternantes na administração do Estado e da Economia capitalista. No caso cubano, a esquerda do Capital no Estado é uma burocracia político-militar-empresarial que explora ou extrai mais-valia do proletariado, vigia-o e reprime-o brutalmente, faz suculentos negócios com empresas internacionais e já apoiou sangrentas ditaduras em outros países, tanto de esquerda como de direita.

Em síntese, nos posicionamos contra o capitalismo, contra seus defensores de direita e seus falsos críticos de esquerda. Ao mesmo tempo, estamos a favor da autonomia proletária expressada na ação direta e na auto-organização das massas, da ruptura revolucionaria e da revolução comunista mundial. Porque a emancipação dos trabalhadores será obra dos próprios trabalhadores ou não será. Porque sem ruptura com as falsas críticas e falsas alternativas ao capitalismo não haverá revolução. E porque a revolução será antimercantil, antiestatal e internacional ou não será.

Por isso que, no atual contexto histórico e mundial, que ainda é contrarrevolucionário, nos posicionamos a favor dos protestos e revoltas proletárias em todas as partes contra as miseráveis condições materiais de existência de nossa classe e contra todos os governos do Capital, como é a atual revolta em Cuba, apesar de todas as suas fraquezas, limitações e contradições. Porque a melhor “escola de formação” para o proletariado é a própria luta de classe, e essa, por sua vez, é o único modo de produzir crises revolucionarias e germes de comunismo e anarquia. Acima de tudo, estamos a favor daquelas lutas que mostram germes e tendências de autonomia de classe e de ruptura com as condições capitalistas e, em especial, com sua própria condição de classe explorada e oprimida. Germes que podem ser vislumbrados nas revoltas dos últimos anos. Sem deixar de sermos objetivos e críticos das mesmas. Com a perspectiva de que as contradições e os conflitos sociais se intensifiquem, que a correlação de força se inverta, que a revolta proletária global retorne, e que está se critique e se supere a si mesma para que se transforme em revolução social – não política, social – internacional.

Revolução na qual se insurrecione e se comunize todo o existente, a fim de frear a atual catástrofe capitalista e de criar uma vida que mereça ser vivida por todos em todas as partes, inclusive na região cubana. Revolução que, sobre a base da abolição do trabalho assalariado e da troca de mercadorias, realize a abolição da sociedade de classes, gêneros, raças e nacionalidades. Substituindo-a por novas e múltiplas relações sociais não-mercantis, não-coisificadas e não-hierárquicas entre indivíduos livremente associados sem separações ou fronteiras de nenhum tipo, em equilíbrio com a natureza.

Entretanto, o capitalismo e a luta de classes continuaram desenvolvendo-se desigual e catastroficamente em todo o planeta, até que à humanidade não lhe reste opções a não ser o comunismo ou a extinção. E a partir daí, nada nem ninguém será poupado. Cuba é hoje apenas mais um episódio crítico nesse drama histórico-mundial em curso. 

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 A Colômbia arde!

Série de textos de diferentes grupos internacionalistas, com título retirado dessa coletânea apresentada pelo grupo TŘÍDNÍ VÁLKA.


Correspondência desde Colômbia [1]

As ondas de protestos atuais começaram em 28 de abril, onde se iniciou o paro por conta de uma reforma tributária com a intenção de tapar o buraco fiscal do Estado e evitar que a dívida externa do país tenha mais pontos nos qualificadores de risco, o que subiria a inflação. Do que não se fala é que a dívida do país pertence aos grupos empresariais, banqueiros, empresas de infraestrutura, o que se limita aos ricos do país, que são quem não pagam impostos.

Essa reforma buscava gravar com o IVA de 19% um produto de uso básico e serviços básicos em um país onde 43% da população sobrevive com menos de um salário mínimo e come entre uma a duas vezes ao dia; onde o governo gastou 9.600 milhões de pesos em 23 caminhões para seu plano de segurança, 12.000 milhões de pesos em 18 tanques para as forças repressivas, 14 bilhões de pesos em 24 aviões de guerra F16; onde o programa periódico que o presidente emite todos os dias para lavar sua imagem custa 3.200 milhões de pesos. Tudo isso sem contar os roubos por custo excedente na compra de mercados por parte de prefeituras e governanças em muitas partes do país para assistência à famílias em crise; sem contar com o pagamento de auxílios de pandemia a pessoas inexistentes e mortxs; com o dinheiro destinado à saúde que permanece nos cofres das empresas privadas, em um país onde 50 bilhões de pesos são perdidos anualmente na corrupção. Isto o faz o segundo país mais desigual da região depois do Haiti.

Por isso é iniciado o protesto atualmente e se sai às ruas massivamente. Não é somente a reforma tributária; é a reforma do sistema de saúde, que fortalece o sistema privado de saúde; a terceirização dos trabalhadores da saúde; a crise no sistema de pensão; o assassinato de defensores e ativistas de direitos campesinos, indígenas, afros, ambientalistas, despejados, mulheres (630) e ex-combatentes que assinaram o acordo de paz (272); o assassinato de 14 menores, em 4 de março, vítimas de recrutamento forçado por parte do bloque 1 (não desmobilizado) das extintas FARC, pelo bombardeio do exército encoberto pelo governo; o assassinato de 7 menores também em um bombardeio do exército em Caquetá no dia 2 de setembro do ano passado; o denominado “Massacre de Bogotá”; a noite de protestos de 9 de Setembro em Bogotá com o assassinato de 12 jovens após o assassinato de José Ordoñez pela polícia; o massacre da prisão La Modelo, onde foram assassinados 24 presos pelas mãos da guarda penal e do exército e onde houveram 80 feridos entre o dia 21 e 22 de marços de 2020 (protestos iniciados pela falta de garantias de atenção médica devido à pandemia, o que gerou uma crise em todas as prisões do país); o deslocamento forçado de 27.431 pessoas no que já foi de 2021 por conta de atores armados legalmente e ilegalmente e associados ao narcotráfico; o reinício da pulverização de glifosato nas zonas rurais do país; o descumprimento dos acordos de paz com a guerrilha das FARC e um grande etc. Todo isso é o que agrava o protesto, consequência da medida inoperante do governo que mantém os interesses de uma classe política que se valeu do paramilitarismo e do narcotráfico para posicionar-se no poder desde a chegada de Uribe Velez em 2001 e seus candidatos presidentes. Isso representa o partido do governo de ultra-direita: uma máfia narco-paramilitar, funcional aos interesses do capitalismo, dos latifundiários e banqueiros, que têm sido beneficiados nos últimos 70 anos de guerra interna.

O acordo de guerra ao protesto obedece ao medo que exerce o povo aos que controlam os privilégios, o crescimento da pobreza e da urbanização da população, resultado do empobrecimento gerado pelos interesses dos ricos, e evidencia o postulado principal do escrito “o exército nas ruas”. O vemos com o trabalho de extermínio coordenado entre os comandos de operações especiais da polícia (GOES), o Esquadrão Móvel Antidistúrbios (Esmad) e os grupos de operações urbanas do exército. O fim é controlar os pobres de maneira sistemática porque os ricos têm medo, e o controle se exerce da única maneira que sabem: construindo terror através do massacre do povo. Já sabemos quem deu a ordem de massacrar a manifestação a partir do Twitter: foi Uribe, ao dizer que se devia apoiar o direito de policiais e soldados de utilizar armas contra o terrorismo e vandalismo.

Imediatamente seu fantoche Duque decretou a “assistência militar” nas cidades. Desde o dia 3 de maio militarizou-se Calí, a cidade mais empobrecida nesta pandemia, e que apresentou enfrentamentos em diferentes setores populares da cidade. O controle da cidade foi tomado pelo general Zapateiro, o aeroporto é gerido por militares e a ação genocida começa desde esse dia principalmente nos bairros Siloe (histórico bairro popular habitado em sua maioria por população afro que foi deslocada desde o Pacífico pela guerra) e o bairro Puerto Resistencia (Puerto Rellena), ao sul de Calí. Cortou-se o fornecimento de energia na noite, bloqueou-se o sinal de internet para que as pessoas não possam mostrar o massacre continuo que está sendo realizado. Até 4 de maio são 31 assassinadxs por armas de fogo em todo o país, 814 detenções arbitrárias, 10 vítimas de violência sexual, 21 vítimas de agressão aos olhos, 216 vítimas de violência física. Esses são dados que as organizações de Direitos Humanos conseguiram verificar, as quais também foram perseguidas e alvejadas por balas da polícia.

A militarização durante o protesto é mais evidente hoje, no dia 5 de maio, nas maiores cidades ao sudoeste de Bogotá. O exército utilizou helicóptero para mobilizar tropas em Bosa, Kennedy. Criou-se um centro de detenção e tortura no Portal de las Américas (terminal de transporte de TransMilenio). Assim como em Calí, cortaram a luz elétrica e começaram a disparar contra a população. Estão bloqueando os meios de comunicação das organizações de Direitos Humanos e de vítimas para esconder o que está acontecendo, e se inicia a perseguição sistemática de todxs.

Em Medellín, o setor de extrema-direita está chamando a marchar contra o protesto e a favor de defender o exército e a polícia. Há chamadas de ativistas da ultra-direita a saírem armados na rua para “defender a democracia”.

A questão é que ninguém mais compra essa história. Em todos os cantos do país há mobilização. Desde Leticia, no ponto mais sul da Amazônia, até Guajira, no Caribe. Todxs saímos a protestar. Pouco a pouco vão se organizando os comitês de apoio e de protesto. Temos visto nesses dias que a esperança está nas ruas e que a fazemos entre todxs.

É necessário que pouco a pouco se construa uma discussão por parte da mobilização sobre o que se quer com o paro, pois o problema é estrutural e não será resolvido com a mudança de políticas, nem de fantoches da burguesia. A grande maioria que está nas ruas compreende que o problema é o capitalismo. Porém, até que ponto assumimos essa luta?

Com uma juventude sem futuro e sendo essa “pátria” uma fossa comum oculta por mais de 200 anos sob a máscara da democracia, é necessário desmascarar totalmente o poder, para transcender além do protesto em uma sociedade dominada pela ultra-direita e construída pela guerra.

Mais que nunca, é nesse momento urgente a solidariedade, a mobilização e a denúncia do que está ocorrendo atualmente. Por isso, convidamos vocês a mobilizarem-se em solidariedade com o protesto em Colômbia e a evidenciar o massacre ordenado por Álvaro Uribe.

Em Colômbia, todas as noites são a Noche de los Lápices.

***

Pelo que luta o proletariado na Colômbia [2]

Nas últimas semanas, a classe trabalhadora colombiana enfrentou com firmeza os novos ataques da burguesia, cristalizados dessa última vez em uma reforma fiscal do governo que busca incrementar a extração de mais-valia por novos caminhos. O proletariado colombiano vem sofrendo agressões contínuas por parte da burguesia, que se expressam em uma deterioração progressiva das condições de vida, fortes desigualdades sociais e o emprego contundente da violência (militar e paramilitar) contra a mobilização operária e campesina. Os acordos de paz com a guerrilha representaram simplesmente um mecanismo de integração de seus aparatos políticos contrarrevolucionários nas instituições democráticas do capital, tendo-se estendido por todo o país os acertos de contas contra os líderes dos protestos populares, enquanto que a burguesia latifundiária relança sua ofensiva contra o proletariado rural. As circunstâncias geradas pela nova pandemia do capital, o covid-19, agravaram ainda mais a situação em questão de desemprego, miséria e maiores impostos. Em realidade, essa reforma fiscal foi a gota que encheu o vaso para que se produzisse um estouro social de enormes proporções.

Porém, nos equivocaríamos se tentássemos compreender este estouro social em termos exclusivamente nacionais. Pelo contrário. A resposta da classe trabalhadora colombiana aos planos de fome e miséria de sua burguesia é parte da recomposição do proletariado mundial (e latino-americano), em sua luta para sobreviver a um capitalismo que esgotou suas possibilidades de desenvolvimento orgânico. A radicalidade das formas de luta nas ruas das principais cidades colombianas é uma resposta desde baixo a um capital que é incapaz de articular o valor como relação social, que avança sob expressões cada vez mais fictícias, extraindo mais-valia através de todos os tipos de mecanismos imagináveis e através do uso da força e da violência de maneira crescente.

No nível mundial, estamos observando como o proletariado vem enfrentando-se com o capital desde os começos da crise de 2008. Em princípio, como ocorreu com as revoluções árabes de 2011 e o 15-M na Espanha, com muitas ilusões democráticas e cidadanistas, de regeneração do sistema. Nessas mobilizações sociais, a classe média e suas guerras culturais pós-modernas desempenhavam um papel hegemônico. Porém, com o passar do tempo, a classe trabalhadora radicalizou suas lutas, enfrentando mais diretamente as condições materiais que impõe os planos de exploração do capital. Em 2019, os estouros sociais no Chile, que tiveram como gatilho a subida dos preços do transporte urbano, e no Equador, que também foram desencadeados por um agressivo ajuste fiscal, representaram uma mudança de cenário na luta de classes no subcontinente latino-americano. Abriram uma fase de maior radicalização nas lutas operárias, produzindo-se um enfrentamento mais direto com o capital e seus governos. O que está acontecendo na Colômbia nas últimas semanas não pode ser entendido sem fazer alusão a esse marco mais global de maior radicalização social.

Como aconteceu anteriormente no Chile e no Equador, o proletariado colombiano mostrou-se de enorme valentia e radicalidade nas ruas, enfrentando inclusive grupos paramilitares que dispararam fogo real, sem contemplações, nos manifestantes. Em Calí, epicentro dos protestos, as comunas (os bairros) da periferia da cidade organizaram-se coletivamente não somente para enfrentar a violência dos corpos repressivos. Além disso, têm tido de organizar o fornecimento de viveres, a proteção frente aos agentes infiltrados, o transporte coletivo, o cuidado dos feridos, etc., já que o governo tentou fazê-los renderem-se por fome e cancelamento dos serviços básicos. A resposta dessas comunas, como Puerto Resistencia, é uma amostra da capacidade de nossa classe para construir relações sociais à margem das impostas pelo capital e seus Estados, onde ao mesmo tempo em que se reorganizam as condições materiais de vida, produz-se uma revolução nos valores e nas relações humanas. O mundo deixa de estar invertido, como acontece no capitalismo, e as necessidades sociais passam a ser prioritárias com respeito a qualquer outro critério (como a acumulação de capital sem limites) nas decisões que as comunas tomam nos usos dos recursos disponíveis e nos esforços que dedicam a alcançá-los. Tudo gira, deixa de estar ao contrário. Assim, por exemplo, uma ativista das lutas ambientais, que até então precisava de escolta diante das múltiplas ameaças e assassinatos cometidos pelos paramilitares, agora caminha livre, sem medo, entre seus vizinhos. A mobilização proletária lhe devolveu sua segurança, freou a violência do capital naqueles espaços onde nossa classe impôs sua lógica de vida (frente à lógica de morte do capital).

São vislumbres de uma sociedade nova, são lampejos de comunismo, são os murmúrios, os começos, da constituição revolucionária de uma classe que resiste sucumbir junto com um capitalismo moribundo. O comunismo não surgirá da cabeça de nenhum gênio, nem das diretrizes exógenas de nenhuma vanguarda esclarecida. É um movimento histórico que emana das entranhas da sociedade, que surge no estrondo das lutas do proletariado para garantir suas condições de existência, quando o capital, na sua tentativa desesperada de continuar incrementando seus benefícios, não deixa outra opção à nossa classe que se organizar socialmente de uma maneira alternativa, de modo a garantir suas condições de vida. Certamente, ainda é insuficiente o que estamos vendo nas comunas de Calí ou de Medellín, ou nos bairros de Santigado no Chile, essas novas relações sociais somente podem impor-se à lógica do capital no nível mundial. Porém, sem dúvida, mostram o caminho a seguir, são experiências onde nossa classe vai aprendendo a combater o capitalismo em um plano real, material, não se conformando com as ilusões culturais, democráticas, que lhe são sussurradas pela esquerda pós-moderna.

Porém, como dissemos, estamos no começo de um processo que é extremamente complexo, carregado de perigos. A própria esquerda colombiana, tanto no nível político como sindical, está tentando desviar as lutas para o terreno eleitoral e ao da negociação com o governo, prendendo o proletariado no labirinto tecnocrático das reformas cosméticas de um capital que somente pode oferecer a catástrofe e uma exploração maior. As falsas esperanças da socialdemocracia, expressadas na Colômbia na candidatura presidencial de Gustavo Petro, ou na prefeita de Bogotá, Claudia López, representam o maior perigo para nossa classe na sua luta por uma vida melhor. A socialdemocracia, na sua tentativa de gerir a crise do capital, em sua tosca tentativa de construir um capitalismo amável ou inclusivo termina irremediavelmente convertendo-se em mais uma marionete da lógica do valor. Se o capital encontra-se em perigo pela mobilização proletária, sem nenhuma dúvida esses personagens da socialdemocracia colombiana não terão nenhum remorso em atuar com a violência e a mesma contundência com as quais hoje atua o presidente Iván Duque. Na Colômbia, como no resto do mundo, o proletariado revolucionário buscará sua via independente, como Karl Marx avisou no Manifesto Comunista de 1848. O proletariado é a única classe social que dispõe das condições materiais para construir uma sociedade por fora da lógica do valor. É necessário combater com todas as energias a socialdemocracia, as ilusões democráticas que prometem uma gestão benévola do capital, as correntes oportunistas que pretendem colocar nossa classe no dilema de eleger (com especial empenho no terreno eleitoral) entre as formas mais progressistas e mais reacionárias do capital. É uma eleição falsa. Do capital em suas diferentes formas somente podemos esperar miséria e desolação. Os trabalhadores e as trabalhadoras das comunas colombianas indicam-nos um caminho alternativo, real: o da autodeterminação proletária através da luta de classes.

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Solidariedade com a revolta na Colômbia: Abaixo o genocídio estatal [3]

Proletários do mundo, uni-vos!

Colômbia é, já faz quatro dias, cenário de uma revolta proletária com características similares à que balançou a região chilena durante as jornadas de outubro-novembro de 2019. A continuação do ciclo de luta aberto pelas revoltas no Equador e no Chile é um sintoma de que o capital, em sua reestruturação pós-pandemia, está em uma crise de magnitudes históricas.

O que fez as multidões saírem às ruas foi uma reforma tributária (imposto de renda e IVA), que o proletariado colombiano compreendeu, em uma lúcida crítica prática, como um modo de dirigir o custo da catástrofe para a população.

A crise do capital, que a pandemia somente acelerou, é um processo que se manifesta de diversas formas, sendo as reformas tributarias uma delas, que se soma à destruição acelerada e estendida da natureza e à expulsão de grandes massas de assalariados para fora do processo produtivo - com a criação de população descartável para o capital – e suas sequelas encarnadas em ondas migratórias e um crescente crime organizado alimentado pela miséria, entre outras manifestações que se farão cada vez mais cotidianas. Nesse sentido, é prioritário compreender que qualquer tentativa de reforma é somente um mecanismo para eternizar este verdadeiro zumbi que é o capital, perpetuando a relação social fetichista, sobrepondo a produção do valor às necessidades humanas, em síntese, destruindo no altar do capital tudo em seu caminho.

A resposta do Estado colombiano – como também foi a do Estado chileno, e a de todos os Estados do mundo – não pôde ser outra além da repressão sangrenta contra noss@s companheir@s; no momento em que são escritas essas palavras de solidariedade já são mais de 20 mort@s, muit@s companheir@s pres@s e ferid@s, além de imigrantes expuls@s por participar ativamente dos protestos.

Calí, uma das maiores cidades da Colômbia, foi militarizada em 30 de abril. Foram destacados 3.000 policiais: um verdadeiro déjà-vu de 19 de outubro em Santiago, no Chile. O problema não é somente Iván Duque, é o sistema produtor de mercadorias, que se mostrou como é, evidenciando que o verdadeiro rosto da democracia não é mais que a forma que o capital assume para impor sua dominação, criminalizando e deixando sentir toda sua brutalidade sobre quem luta pela liberação desta forma nefasta de relação social.

A necessidade de articular a luta a nível internacional, de vislumbra-la contra todas as separações que nos impuseram como humanidade com a irracionalidade genocida, é de extrema premência: urge gerar laços de apoio e continuar a luta nos territórios para superar esse mundo. O movimento do capital somente continuará produzindo miséria e, diante disso, a luta de classes explode, e continuará explodindo, em diferentes tempos e espaços como produto desse movimento: somente o proletariado é capaz de frear absurdo em que se converteu esse mundo.

Somente a revolução comunista internacional nos fará livres!

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Colômbia arde contra o governo fascista de Iván Duque [4]

Na última quarta-feira, 28 de abril, as mobilizações contra a reforma tributaria voltaram às ruas, em formato de paro nacional. Depois da morte de uma pessoa em Calí pelas mãos da polícia, as ruas – em diversas cidades além de Calí, como Medellín e Bogotá – questionaram o monopólio da violência do Estado colombiano através de incêndios dos meios de transporte e saques de bancos, entre outros. A reação das autoridades governamentais materializou-se na implantação de forças policiais e militares sob o toque de recolher. E em uma crescente repressão que não cessou desde então.

O conflito continuou intensificando-se nesses dias até ontem, quando o presidente Iván Duque (mesmo partido, linha de governo e apoio que o ex-presidente Álvaro Uribe, mesmas mãos manchadas de sangue) aprovou a “Assistência militar”, um eufemismo para militarizar as cidades do país. Isso gerou uma repressão ainda mais bárbara para tentar calar o protesto social com a linguagem da pistola, através do sangue e do fogo.

As forças repressoras confirmaram 10 mortes, embora diversos relatórios falem de 35 mortes confirmadas. Todas elas assassinatos pelas mãos da polícia e dos militares. Causas: fogo real e espancamentos até a morte. Ocorrem detenções arbitrárias, desaparições forçosas, defensores de direitos humanos foram sequestrados e torturados. Denunciaram-se casos de violações de mulheres por parte das forças armadas colombianas.

O atual presidente está apelando nas redes sociais para que as forças armadas disparem FOGO REAL contra a população civil. Acusam os e as manifestantes de vândalos e terroristas, esquecendo o crime que o governo comete com seu terrorismo de Estado, contra um movimento que pede pão, teto, dignidade por uma vida que mereça ser vivida.

Por parte das companheiras e companheiros dali, têm se falado de um paro indefinido em todo o território nacional. Os povos indígenas realizarão a minga indígena – união das etnias indígenas para marchar até onde se encontra o governo. As mobilizações seguem fazendo-se serem notadas nas estradas de entrada e saída do país com bloqueios, queima de pedágios, tomada de estradas, enfrentamentos diretos... E chegará à capital, Bogotá, em breve.


Notas:

[1] Texto anônimo. Recebido e publicado por Biblioteca Alberto Ghiraldo, em Rosário, Argentina, na primeira semana de maio de 2021. Pode ser encontrado em espanhol aqui: https://panfletossubversivos.blogspot.com/search?q=Correspondencia+desde+Colombia.

[2] Texto produzido pelo grupo Barbaria e postado em 30 de maio de 2021, disponível em espanhol aqui: http://barbaria.net/2021/05/30/por-que-lucha-el-proletariado-en-colombia/.

[3] Texto produzido pelo grupo Vamos hacia la vida e postado em 04 de Maio de 2021, encontrado em espanhol em: https://hacialavida.noblogs.org/solidaridad-con-la-revuelta-en-colombia-abajo-el-genocidio-estatal/.

[4] Texto produzido pelo grupo Valladolor Internacionalista e postado em maio de 2021, disponível em espanhol: http://valladolorinternacionalista.blogspot.com/2021/05/colombia-arde.html. 

 

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